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Mentiras
Há quanto tempo você não mentia para mim? Ou pelo menos há quanto tempo suas mentiras não me feriam? Ou será que eu ainda estou perdida? Pensei que tinha me achado quando você partiu, mas parece que isso não aconteceu, a cicatriz ainda está latente, ardendo dentro da alma, sangrando o pouco de dignidade que eu preservei. O problema não foi o que aconteceu e nem o que não deveria ter acontecido, a verdade é que eu não fui capaz de mudar.
Mas esta manhã eu li seu recado no meu email, por um instante eu ri sozinha pensando que aquilo fosse brincadeira, mas meu coração não achou graça alguma. Desde quando você foi de dizer mentiras? Sei que você não quis dizer aquilo, porém... Por que disse? Será que você sabe o quanto ler aquelas breves palavras foi doloroso? Por favor, nunca mais diga frases gentis como aquelas se o que você quer é apenas me ter em seus braços para satisfazer seus desejos.
Sei que você nunca aprendeu a dizer futilidades, isso era algo que somente pessoas como eu são capazes de fazer, falar coisas falsas acreditando serem verdadeiras; você é sincero demais para compreender as sutilezas maldosas que a vida sussurra para almas tristes, como a minha. Não tente enganar o coração de uma pessoa cheia de mácula, porque minha inocência perdeu-se quando aprendia a voar com minhas próprias idéias. Verdade é que acho que nunca fui sincera, ou você que é sincero demais e isso me incomoda.
Às vezes eu me pergunto coisas inúteis procurando uma resposta plausível, porém, não sou capaz de entender completamente as tramas que envolvem a vida. Quando você vai perceber que meus sentimentos por você são o que são e não importa o que seu coração diga, eles não mudarão, porque assim como infinito possui uma constante inabalável, meus sentimentos estão presos no destino de te seguirem incansavelmente.
Mas talvez... Será que eu minto tão bem? Ou você que se engana tão facilmente? Porque eu sempre sinto que estou enganando a mim mesma e parece que você sempre está aceitando tudo o que eu digo de forma tão natural. Não, creio que você é quem mente para mim, fingindo aceitar o que sou apenas para deitar mais uma vez na minha cama. Quanto hipócritas podemos ser com nós mesmos?
Porém, há uma verdade que você deve saber: quando digo que vai ficar tudo bem, não importando as circunstâncias é porque ainda tenho esperança de me apoiar em você, se fico calada observando sua risada exagerada é porque ainda espero aquele seu sorriso mais suave brotar naturalmente em seu olhar, se estou sozinha olhando para o outro lado da janela é porque estou esperando por você, se olho para longe, perdida em pensamentos, é porque sinto a sua falta consumindo todos os meus sentimentos e fazendo o desespero brotar em meu coração.
Acho que as mentiras que conto a cada dia para mim mesma estão afastando-me ainda mais da realidade, aquela dura e cruel verdade que eu já conheço: você não é parte de mim. E por mais estranho que possa parecer até que não é tão ruim escapar de você, pelo menos consigo ver além do que é obvio e respirar um ar que não seja a sua colônia impregnada de sedução.
Acho que já não sou mais aquela frágil garota que você conheceu há tempos passados, minha inocência foi substituída pelos olhares inquietantes, eu acho que cresci um pouco, e aprendi a viver, pelo menos é isso que eu acho, mas talvez eu não tenha mudado em nada, talvez o que mudou foram os seus olhos que não são os mesmos de antes. Este fato me irrita um pouco.
O seu olhar, vendo-o assim mais de perto, me parece mais maduro, pelo menos é o que os outros dizem, porém, eu acho que ele está distante, longe de todos e de tudo, abstraído da vida que o rodeia, mirado em sua própria realidade, seus olhos se tornaram como o vidro: frios e sem vida, como se fosse uma barreira intransponível.
Desliguei o computador, terminei de tomar o café, levantei e fui para o trabalho, mas no email ainda está gravado o recado que você me deixou, aguardando que aquela mentira se torne parte do passado ou que eu a apague tentando tirar você da minha vida.
